domingo, 7 de maio de 2017

Relato: Audax BRM 200

Minha participação no Brevet Randonneur Mondiaux de 200 km em Itupeva/SP
Como vocês dever ter lido na postagem anterior, fiz um preparativo minucioso para a prova organizada pelo pessoal do Randonneurs Litoral. A bicicleta com os seus acessórios estavam prontos e a estratégia traçada, só faltava mesmo era cuidar do corpo. Seguindo dicas de amigos e de relatos de outros randonneurs que encontrei pela internet, nos 3 dias antes da prova eu aumentei a ingestão de carboidratos para poder ter bastante energia acumulada (como seu eu já não tivesse um estoque bem grande na região abdominal, mas sei lá ehehehehe...) e tentei adaptar o meu corpo para dormir mais cedo, porém com a rotina daqui de casa ficou difícil de modo que apenas na quinta-feira eu consegui pegar no sono às 22:30, tendo acordado às 08:00 no dia seguinte. Esse acho que foi um erro porque estava com o corpo tão descansado que não preguei o olho na noite seguinte, que era a mais importante. Fiquei rolando de um lado para outro da cama até dar a 03:00 e ter que levantar para seguir para Itupeva.

Minhas coisas estava já todas prontas e embarcadas no carro. Fiz um prato de banana com granola e iogurte de café da manhã café da madrugada e preparei dois lanches com lombo e queijo minas, um para comer antes de largar e outro depois que chegasse, mais 500 ml de suco de caju. Peguei o carro e uma hora depois, às 04:40, chegava ao Hotel Buriti Itupeva. Tratei logo de colocar as rodas na bicicleta e encher as caramalholas (uma com água e outra com isotônico). Como a vistoria se iniciaria somente às 05:50, fiquei o restante do tempo relaxando dentro do carro ouvindo música e mentalizando a prova. Às 05:30 eu coloquei toda a indumentária, tendo decidido não colocar a blusa corta-vento porque não chovia desde o início da noite e também apesar de estar fazendo 13ºC eu estava confortável com a blusa dry de manga comprida que coloquei por debaixo da jersey de ciclismo. Foi uma decisão acertada e que funcionou bem ao longo da prova. Tudo pronto, fiz minha oração pedindo proteção e ajuda para vencer as dificuldades que certamente viriam.

Chegada a hora marcada, me apresentei e fui o primeiro a passar pela vistoria. Os organizadores conferiram meus equipamentos e recebi o passaporte. Junto dele me deram um saquinho zip e uma cópia do roteiro do percurso. Às 06:00 em ponto larguei junto de outros 3 ciclistas. Os organizadores, de forma inteligente, definiram fazer o início em ondas, soltando os competidores em blocos com diferença de alguns poucos minutos entre eles.
Após a vistoria e pronto para a largada

Antes de sair eu liguei o Runkeeper no celular para monitorar o pedal, mas esqueci de zerar o ciclocomputador e o GPS, o que fui fazer apenas 4 km à frente, mas isso não me atrapalhou. Logo no início eu saí pedalando lado a lado do Márcio, de São Bernardo do Campo, um camarada que conheci por ali mesmo e que acabei cruzando com ele em alguns momentos pelo brevet. Os nossos aparelhos de navegação indicavam uma rota saindo do hotel mas os outros dois que saíram um pouco na nossa frente estavam indo por outro caminho. Gritamos para avisar mas eles não ouviram. Enfim, seguimos o GPS e logo estávamos na avenida principal da cidade, rumo à Rodovia Vice Prefeito Hermenegildo Tonoli.

Ficamos pedalando mais algum tempo na parceria até que veio a primeira grande subida. Como eu não queria forçar, deixei o Márcio seguir em frente e fui tocando de leve. Entramos na SP-300 Rodovia Marechal Rondon e veio o raiar do sol maravilhoso (minha 3ª vez montado na bike!). Pedalava tranquilo quando um japonês, que era um daqueles perdidos da largada, me passou como um raio em uma das subidas. Só deu tempo de ouvir dele: "Começaram as escaladas!". Durante uns 5 km eu consegui manter ele e o Márcio no visual, depois desapareceram. Porém, de repente vejo um ciclista parado com a bicicleta virada para cima no acostamento. Era o Márcio com o pneu furado. Parei e perguntei se precisava de ajuda, mas ele disse que estava tranquilo, já desmontando o pneu com as espátulas. Segui em frente e mais ou menos na marca dos 20 km o 2º perdido me passou também, mas esse ficou bem perto até o acesso da SPA-85 Rodovia Dom Gabriel Paulino Bueno Couto, uma estrada de pista simples e sem acostamento que a organização já tinha nos alertado para tomarmos cuidado. O asfalto estava muito molhado devido à chuva da noite anterior e fui devagar, sempre acionando os freios. Foram 6 km praticamente sem pedalar e morro abaixo, mas pensando na volta já imaginava o quanto seria difícil aquele trecho, o pior de todos os paredões em altimetria segundo a planilha de rota. Mas isso será tema tratado alguns parágrafos mais à frente.

Continuando, lá pelo km 30 entramos na maravilhosa SP-312 Estrada Vereador José de Marais, que leva à pacata cidadezinha de Pirapora do Bom Jesus. Me chamou a atenção a imensa quantidade de ciclistas naquela pista! Eram atletas e entusiastas dos mais variados tipos, sozinhos, em grupos ou em pelotões de até 50 indivíduos, em geral pedalando absurdamente forte. Vários triatletas com suas bikes de contra-relógio, inclusive muitas mulheres. Ali eu constatei o quanto o esporte está crescendo no Brasil. O primeiro Posto de Controle (PC1) ficava na Igreja Matriz da cidade, no km 57, mas bem antes disso eu passei por vários inscritos do BRM 600 que vinham no sentido oposto, uma vez que a largada deles tinha sido 1 hora e meia antes da minha saída de Itupeva. Neste trecho passei pelo primeiro dos três grandes morros que enfrentaria, numa sequencia de curvas bem "divertidas". Digo divertidas porque cada vez que eu pensava que a ladeira tinha acabado, vinha outra, e depois outra, e depois outra. Era a rodovia me pregando peças e rindo do meu sofrimento, só pode! A minha média horária até então estava em 24 km/h e depois da pirambeira caiu para 22 km/h.

Enfim, cheguei ao PC1, que nada mais era do que uma mesa com o voluntário da organização. Ele me pediu o passaporte, que foi devidamente carimbado e anotado o horário. Aproveitei e fui ao banheiro num boteco ao lado, comi um pão de queijo de ontem requentado no microondas, junto de uma coca-cola deliciosamente gelada. Voltei ao PC, onde tinham disponíveis mariola (aquelas bananinhas com açúcar), paçoquinha, isotônico e água, tudo à vontade mas fiquei apenas com os líquidos. Lá eu também encontrei os dois ciclistas que tinham se perdido na largada. Descobri que um deles estava fazendo o Desafio de 110 km e o outro, o japonês escalador, estava no BRM 200 comigo e acabou saindo uns 2 min antes de mim daquele PC. Fiquei ao todo uns 15 min parado e retomei, não sem antes enviar uma mensagem de whatsapp para a família reportando onde eu estava e que ia tudo bem. Nesse momento da saída do PC1 a minha média estava em 21,2 km/h, ou seja, com uma certa folga em relação ao que eu havia planejado que seria os 19 km/h. Contudo como eu ainda estava só com 25% completados era bom ter uma gordura, além do que eu estava me sentindo muito bem. Ficava fácil eu monitorar esses dados porque deixei o Runkeeper no celular configurado para me informar pelo auto-faltante as informações de tempo, distância acumulada e velocidade média geral, tudo a cada quilômetro.
Igreja Matriz em Pirapora do Bom Jesus

Saindo então de Pirapora, lá vinha a serrinha engraçada novamente, só que ao contrário. Segui em ritmo relaxado e leve, alternando pedalada sentado com pedalada em pé, mudando as pegadas no guidão e às vezes fazendo mais força na puxada dos pés para cima do que empurrando para baixo, sempre visando a alternância dos grupos musculares para não fadigar precocemente. Com a segunda pirambeira forte da prova vencida, era hora de curtir a descida! Também aprendi que precisamos melhorar a eficiência do pedal nesse momento, então tratei de segurar no drop para reduzir a área de atrito com o vento e pedalar sempre que fosse seguro e possível. Com essa fórmula foi comum eu atingir rapidamente os 55 ou 60 km/h nas descidas aos longo do brevet. Aliás, defini este último valor como o limite da minha velocidade, afinal, conforme meu sábio amigo Corralo diz, "sou arrimo de família". A segurança sempre em primeiro lugar!

Continuando, entrei na Estrada dos Romeiros, me misturando com os inúmeros pelotões e grupos menores de ciclistas, agora  majoritariamente no mesmo sentido do que eu. Como eu estava numa prova e com propósitos bem diferentes, em momento algum me aventurei a entrar em qualquer roda para aproveitar o vácuo. Alguns até ofereciam, mas eu agradecia e ficava no meu ritmo, mesmo porque isso seria contra as regras do Audax, que prega a total independência, sendo possível apoio apenas de outros participantes do brevet. Pedalar ali foi um prazer enorme. A estrada é muito bonita, totalmente cercada por árvores e o pavimento parecia um tapete. O pedal rendeu demais e facilmente eu conseguia manter de 32 a 35 km/h nos planos, às vezes até mais. A densa vegetação beirando o rio Tietê de um lado e a parede de rocha do outro tirava qualquer possibilidade de vento, além disso os poucos motoristas já estavam muito acostumados aos ciclistas e tinham conduta exemplar, passando pela gente a bem mais do que os 1,5 m exigidos pelo CTB, mesmo quando havia acostamento.

Terminada a etapa da linda Estrada Parque de Cabreúva, eu estava com 100 km acumulados e comemorei - "já estou na metade!". Entrei na Rodovia Engenheiro Herculano Godoy Passos, num pequeno trecho de 7 km de ligação até a Rodovia do Açúcar (SP-075), pista que eu deveria seguir para passar por Itu, Salto e chegar a Indaiatuba, onde estaria o PC2. Porém, antes desse Posto de Controle eu tinha preparado uma parada num posto de combustíveis próximo ao km 110. Como planejado, fiz a minha pausa para descansar e me alimentar. Comprei a um hambúrguer assado, duas bananas e um Gatorade de uva. Também comprei um par de pilhas AA pois já tinha substituído as do GPS em Pirapora que tinham estranhamente sido consumidas precocemente. Pelo manual do aparelho, pilhas alcalinas deveriam durar 15 horas, em média e eu estava sossegado levando um par a mais e que provavelmente nem iria precisar. Só que não! Ali na parada vi que o GPS com as pilhas reservas estava mais uma vez dando informação de bateria fraca. O problema é que na lanchonete do posto não vendiam pilhas alcalinas e as comuns que comprei sequer ligavam o aparelho. "Ainda bem que eu tinha o mapa impresso", pensei. Praticamente desconsiderei a navegação pelo GPS a partir dali e deixei ele hibernando na esperança de haver energia em casos que o mapa não resolvesse.
Pausa para reabastecimento e comemoração após 100 km vencidos

Vida que segue. Antes de sair tirei fotos e mandei para a família, junto da minha posição geográfica para eles acompanharem. Peguei novamente a SP-075 onde o ritmo já havia diminuído por conta da sujeira e da rugosidade do asfalto do acostamento, e do tobogã característico do relevo paulista com suas intermináveis subidas e descidas longas. Assim, passados 122 km eu chegava ao PC2, numa tenda armada no estacionamento de um posto em frente da fábrica da Toyota. Mais uma vez, isotônico e água à vontade, além de bananas as quais não dispensei. Estavam lá dois voluntários para fazerem os registros nos passaportes e ajudarem os participantes no que precisasse, pessoal muito simpático por sinal. Encontrei também dois participantes do BRM 600, com os quais troquei rápidas palavras e desejei sucesso. Um deles terminou seu alongamento e saiu; o outro, um senhor de pelo menos 60 anos partiu um pouco depois de mim. Logo ele me alcançou pois eu tinha pegado a pista principal para fazer o retorno, enquanto que o correto era ter ido pela marginal, então precisei descer da bike e atravancar pelo gramado até chegar na pista correta. Acompanhei aquele senhor por mais alguns quilômetros conversando bem pouco. Acho que ele estava um pouco aborrecido... Lá no PC havia contado que tinha se perdido e rodado um monte de quilômetros desnecessariamente. De toda forma fiquei admirado com ele por estar enfrentando os 600 km, sobretudo pela confiança, preparo físico e disposição que demonstrava. Seguramente deveria ter vários brevets nas costas e quem sabe eu estava até diante de um famoso Super Randonneur e não sabia. Me separei dele quando tomei de volta o caminho para Itu enquanto que o percurso para quem fazia o BRM 600 continuava pela SP-075.

Entrei então na "cidade das coisas grandes" e fiz mais uma pausa estratégica programada. O local escolhido desde a fase de planejamento era um Posto Ipiranga perto da rotatória de um shopping, quando eu deveria estar já com 153 km acumulados, aproximadamente 75% do percurso total. Ali eu comprei uma água de 1,5 L e um Gatorade. De novo, não tinham pilhas alcalinas para o meu GPS. Sentei na mesinha da conveniência enquanto enchia as garrafinhas com água e matava o isotônico. Também mandei a tradicional mensagem de whatsapp para a família, com foto e relatório sucinto. O dono do local se aproximou curioso e começamos a conversar sobre o Audax. Contei alguns detalhes e ele ficou admirado (tanto quanto assustado) devido às distâncias - reação comum à maioria das pessoas quando eu comento sobre os BRMs e suas distâncias. Ele fez questão de tirar uma foto minha para postar na página do Facebook da lojinha:
Parada estratégica na loja de conveniência de um Posto Ipiranga em Itú com 153 km

Passados os 15 minutos de descanso, hora de continuar. Nesse momento a minha média horária geral estava em 20,8 km/h, totalmente dentro do previsto. Segundo a planilha do PC2 eu era o 3º dos 17 que largaram para o BRM 200, mas isso não era importante para mim, já que eu estava ali para chegar e não para competir. Queria mesmo era cumprir o planejado e terminar a prova dentro do tempo máximo, preferencialmente sem cãibras ou dores. Fui então rodando naquele ritmo de sempre até chegar novamente à bela Estrada dos Romeiros, desta vez no sentido para Cabreúva. Na entrada eu passei pelo Márcio, que estava ao lado da bicicleta mexendo no celular. Dei um alô para ver se estava tudo bem e segui quando ele me respondeu com um joinha. Mais uma vez eu estava naquele maravilhoso tapete de asfalto lisinho e rodando fácil. Só que desde a primeira vez que passei por ali, vi que num determinado ponto o rio Tietê tem umas corredeiras e a poluição das águas forma muita espuma. Resolvi parar para tirar uma foto para mostrar para a minha filha que estava estudando justamente isso em geografia na escola. Retomei ao pedal e fui ultrapassado de novo pelo Márcio, que seguiu sempre em frente mas nunca longe da minha visada.
Poluição do rio Tietê

A essa altura do brevet eu acumulava 160 km percorridos e estava muito feliz porque tudo ia conforme previsto, na verdade até um pouco melhor. Eu me sentia bem, apenas com uma leve fadiga nos músculos anteriores da coxa, algo perfeitamente administrável. Eu já tinha percorrido pouco mais de 3/4 da prova e estava numa média horária ligeiramente mais rápida, havendo apenas uma última dificuldade significativa que seria uma pirambeira para ser escalada no retorno para a Marechal Rondon, que eram aqueles 6 km de serra com inclinação de até 10%. Foi então que levei um susto e tomei uma queda besta! Eu estava numa subidinha leve, aproximadamente a 15 km/h quando me apareceu um desnível na pista que não vi a tempo. Livrei a roda da frente mas a traseira pegou de lado no degrau do asfalto molhado, escorregou e me levou ao chão num tombo ridículo. Aquela mesma rodovia que antes brincava comigo agora estava querendo lutar judô! Se comparado à competição olímpica era como se eu tivesse levado um ashi-barai, golpe aplicado quase sempre sem muitas pretensões e para pegar o oponente que está distraído. Foi exatamente isso que aconteceu comigo. Mas se fosse pontuar seria no máximo um Yuko porque caí de lado, quase que de frente. Ralei um pouco o joelho e só. Peguei as garrafinhas que saíram rolando para o meio da pista, ajeitei as luzinhas traseiras, sacudi a poeira e segui em frente. 

Mais alguns quilômetros e eu sabia que estava chegando o PC3, que era virtual. Isso significa que não haveria ninguém da organização por ali, mas precisaríamos comprar algo e apresentar a notinha como prova que passamos pelo ponto, ou então tirar uma fotografia com o celular. E assim, num posto de gasolina ASTER na esquina da SP-270 com o acesso para a serra da rodovia Dom Gabriel Paulinho Bueno Couto estava o Márcio parado tomando uma coca-cola. Parei e perguntei se era ali mesmo o PC3. Ele respondeu que não pois na planilha constava que o posto de combustível era da bandeira BR. Realmente eu me lembrava de ter lido na planilha da rota publicada no site do Randonneurs Litoral que o posto seria um BR. Consultamos o odômetro e a quilometragem não batia com o local onde estávamos, devendo ser cerca de 4 quilômetros mais à frente. O Márcio disse que ainda iria comprar uma água para completar a caramanhola e perguntou se eu queria que ele comprasse um refrigerante para mim. Respondi que não e que iria me adiantar em direção ao PC3 onde lá sim eu queria parar para reabastecer. E fui... Só que o bendito posto não chegava nunca. Comecei a subir várias e várias ladeiras e nada. Percebi então que eu já estava naquela dita serra que terminaria na Mal. Rondon. Pensei: "Bem, o posto deve ser no final dessa serra". Depois de muito sofrimento, cheguei à SP-300 e nada de posto BR. Andei por mais uns 2 quilômetros até uma base da concessionária da rodovia onde decidi parar e me informar melhor. Os funcionários, muito atenciosos, tentaram me orientar mas ninguém conhecia o tal posto. Peguei novamente a planilha da rota que realmente citava o posto BR. Foi então que decidi ligar para os organizadores para tentar uma informação mais precisa com eles, afinal aparentemente eu estava perdido. Peguei o passaporte onde estavam os números de celular mas nenhum deles atendia. Eis que na indicação do local do carimbo do passaporte estava escrito: "PC3 - POSTO ASTER - CABREÚVA". Sim, era aquele mesmo posto lá embaixo da serra, onde encontrei o Márcio tomando coca-cola!

Esse foi o momento mais marcante para mim no brevet. Eu tinha duas opções: 1) continuar dali mesmo na esperança que uma fotografia na base da concessionária ou que o testemunho do Márcio fossem suficientes para comprovar a minha passagem pelo PC3; ou 2) voltar ladeira abaixo para fazer o que estava previsto pelo regulamento. Que dúvida cruel! Tinha sido um sofrimento e tanto subir aquela pirambeira da Rodovia Dom Gabriel Paulinho Bueno Couto, a ponto de eu precisar descer e empurrar a bicicleta a pé por uns 200 m para aliviar as pernas. A decisão veio quando eu perguntei para mim mesmo o que eu faria se eu fosse organizador da prova. Eu aceitaria um participante que chegasse sem o comprovante ou sem a foto do local determinado? Resposta da minha consciência: não. Seria cômodo eu continuar dali mesmo, pois até a chegada restavam pouco mais de 20 km mas se as minhas alegações não dessem certo eu estaria enterrando os planos de Super Randonneur em 2017. Decisão tomada, montei na Scott e voltei.

No caminho aquela situação ficou martelando o meu pensamento mas aprendi com a vida que para superar uma adversidade é preciso resiliência. Se você não conhece essa palavra, talvez a frase que melhor traduz o seu significado é aquela que Rocky Balboa disse em um dos filmes da série: 


"Ninguém te baterá tão forte quanto a vida. Porém, não se trata de quão forte pode bater, se trata de quão forte pode ser atingido e continuar seguindo em frente. É assim que a vitória é conquistada." 

Portanto se fosse necessário subir a pirambeira de novo, eu subiria. Relaxei e curti a descida, que era deliciosa!
PC3 virtual que de BR não tinha nada

Lá embaixo logo parei em frente ao posto e tirei a foto. Por via das dúvidas peguei uma coca-cola na geladeira e paguei com cartão para ter o comprovante. Não era hora de economizar com procedimentos! Ali eu encontrei dois simpáticos casais (Leandro e Evelyn, de Sumaré; Guilherme e Letícia, de Araraquara) que estavam também no BRM 200 e logo perguntaram se eu estava perdido (já que eu vim do lado contrário do caminho). Aproveitei o momento de descanso de todos e contei a minha história. E como aquele seria o meu último ponto de parada, com 177 km previstos mas agora com 195 km acumulados, comi também um  delicioso e quentinho pão de queijo recheado com queijo minas em uma vendinha que ficava em frente ao posto ASTER, recomendação de uma das moças. Fui ao banheiro e logo estávamos todos prontos para a etapa final da prova.

Partimos os 5 juntos, eu muito mais motivado do que antes, sobretudo por ter companhia. Até então tinha ficado quase que o caminho todo sozinho e ter pessoas ao seu lado parece que faz o tempo passar mais rápido e o desconforto ser menor. No caminho continuamos a conversar, e inclusive me fizeram refletir sobre uma parte boa daquilo tudo: seria a oportunidade de ter um Recorde Pessoal de segmento no Strava! kkkkkkkkk. Na verdade, tirando a chateação inicial e o atraso da chegada, não havia mesmo motivos para reclamar. Eu estava descansado e escalando a subida de forma muito melhor do que fiz na primeira vez, além disso eu não teria conhecido meus novos 4 amigos se nada daquilo tivesse acontecido. Enfim, sou uma pessoa de fé e acredito que há um propósito maior quando acontecem coisas assim com a gente.

Portanto, o que antes estava desconfortável, para não repetir a palavra "sofrido" passou a ser divertido. Como eu estava acompanhando o grupo e seguindo num ritmo mais ameno, consegui contemplar mais a paisagem e aproveitar o finalzinho da viagem. Eu estava muito bem em relação ao tempo total da prova e pelos meus cálculos indo naquele ritmo eu ainda chegaria uma hora antes do fechamento da prova. No caminho ainda pude testemunhar a solidariedade do grupo, característica de provas do Audax. Numa das vezes a bicicleta do Guilherme furou o pneu e o Leandro parou para ajudar, enquanto isso fomos seguindo os 3 juntos à frente para ganhar tempo, tendo rapidamente sido alcançado por eles já com o pneu consertado. Depois vimos que as luzes traseiras da Evelyn estavam apagadas, mas o Guilherme logo tratou de emprestar baterias novas que ele tinha de reserva. E no final, usando o pouquinho que ainda restava das baterias do GPS, eu ajudei bastante na navegação do grupo para chegarmos ao destino final, de volta ao Hotel Buriti em Itupeva, ponto de largada e chegada da prova.

Antes disso, porém, ainda na Mal Rondon descobri um infortúnio: todas as mensagens de whatsapp que eu havia mandado para a família não tinham saído do meu celular! Minha esposa me ligou e como não consegui atender ela enviou um SMS querendo saber se eu estava vivo. Meu mundo caiu pela segunda vez! Eu me coloco muito no lugar das pessoas e logo imaginei o quanto ela e minha filha estavam preocupadas. Então enviei um SMS de volta dizendo que estava tudo em ordem e que faltavam só 10 km para eu chegar. Ela respondeu com um "ok" mas eu sabia que teria muito a explicar em casa. Enfim, o aplicativo do celular só voltou a funcionar quando eu o reinicializei mais tarde e daí ele enviou todas as mensagens atrasadas. 

Após esse último percalço e depois de tantos quilômetros, finalmente chegamos! Na recepção estavam dois atenciosos e simpáticos membros da organização que logo pegaram o meu passaporte, conferiram o tícket da passagem pelo PC3 e deram os dois carimbos que faltavam. Depois disso assinei o caderninho, recebi o certificado e a medalha. Enfim, oficialmente um randonneur!
 Passaporte carimbado com passagens pelos 4 PCs

Certificado e medalha

Na entrada do hotel também haviam outros audaciosos recém brevetados e que fizeram questão de nos cumprimentar. Seguem mais fotos:
Recebendo medalha e certificado 

Eu e os dois casais que me acompanharam na etapa final

Números:

Distância percorrida: 222,5 km
Tempo decorrido: 12:24:35
Tempo em movimento: 10:36:35
Tempo em subidas: 04:26:24 (38% do tempo)
Velocidade média em movimento: 21 km/h
Velocidade média geral: 17,93 km/h
Elevação acumulada: 2.526 m
Calorias gastas: 5.737
Pneus furados: 0 (zero)

Link do Strava com o registro da prova: https://www.strava.com/activities/976648943
Mapa do percurso. Clique para detalhes.

Alimentação:
- 3 géis de carboidrato VO2 XCaffeine (com 50 mg de cafeína e 400 mg de taurina)
- 5 géis de carboidrato Aptonia (com vitaminas C e B1)
- 3 barras de proteína Protein Crisp de 45 g (13 g de whey protein)
- 2 pães de queijo grandes
- 1 hambúrguer assado
- 5 bananas
- 2 lanches de queijo branco com lombo defumado no pão francês
- 2 latas de coca-cola
- 7 garrafas de 700 ml de água
- 5 garrafas de 700 ml de isotônico

Conclusões:

- Além do whatsapp, usar o SMS ou então ligar para me reportar à família a cada parada.
- O chamois foi aprovado.
- Preciso pensar em um upgrade na relação, seja aumentando o cassete, diminuindo a coroa ou mesmo incluindo um terceiro disco no pedivela.
- Planejar é preciso. Planejar é necessário. São duas coisas diferentes, importantes e que fazem a diferença.
- A chave para não ter cãibras e dores são duas: alimentação disciplinada durante a prova e os treinos adequados antes dela.
- O tempo das provas no estilo BRM é generoso. Tenho que usar isso a meu favor.
Tudo o que é apressado perde o sentido. Assim como a fruta forçada a amadurecer antes do tempo perde o gosto, concluir um brevet sem se divertir e sem amigos não vale a pena.
- Tenho total condições de fazer os 300 km. Rumo ao BRM 300 em Rio das Ostras!

Agradeço imensamente ao meu Deus por tudo o que passei. Sou grato pela proteção, pela experiência, pelos amigos e pela família que eu tenho, que é o meu bem mais precioso. 

Deixo abaixo o meu salmo preferido (Sl 23), que traduz o meu sentimento hoje:


"O Senhor é o meu pastor; nada me faltará. 
Deitar-me faz em pastos verdejantes; guia-me mansamente a águas tranquilas.
Refrigera a minha alma; guia-me nas veredas da justiça por amor do seu nome.
Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte, não temerei mal algum, porque tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me consolam.
Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos; unges com óleo a minha cabeça, o meu cálice transborda.
Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão todos os dias da minha vida, e habitarei na casa do Senhor por longos dias."


quinta-feira, 4 de maio de 2017

Os preparativos para o AUDAX

Minha preparação para a série em 2017
Inicialmente, se você chegou pela primeira vez aqui no meu blog talvez seja necessário ler as postagens anteriores para uma perfeita contextualização. Clique na coluna à direita para navegar pelas demais narrativas. Elas estão em ordem cronológica.

Continuando então, após a minha ciclo romaria para Aparecida em março de 2016, as viagens do trabalho aumentaram absurdamente naquele ano. Aliado a isso, um problema crônico que eu tinha no ombro direito voltou a incomodar e a doer demais, culminando numa intervenção cirúrgica e colocação de pinos para segurar os tendões. Foi o suficiente para empurrar os planos do projeto Super Rondonneur para 2017.

Então veio o Natal e com ele as sessões de fisioterapia. Depois disso o Ano Novo, fisioterapia, Carnaval, fisioterapia, férias, fisioterapia, e então finalmente eu consegui autorização do médico para voltar a pedalar, mas... sem deixar de lado a fisioterapia. Antes disso, e verdade seja dita, com apenas 4 semanas da cirurgia ele já havia me liberado para as corridinhas, que foram fundamentais para a manutenção do condicionamento e do bem estar. Enfim, peguei de leve a Scott no dia 01 de abril de 2017 e logo o projeto do Audax emergiu. 

Pois é, sou uma pessoa movida a desafios. Se eu não tiver uma meta eu fico apático e desmotivado, sem rumo. Completar a série dos 200, 300, 400 e 600 km já tinha sido um objetivo traçado mas não cumprido, e afinal de contas eu tinha comprado uma baita bicicleta só para isso. Vamos então retornar aos trilhos e traçar a estratégia!

Primeira etapa: definir o calendário!

Entrei no site do Randonneur Brasil e acessei o calendário nacional das provas do Audax (http://www.randonneursbrasil.org/calendario-2017/). Logo vi que eu estava lutando contra o tempo! Para conseguir o Super Randonneur eu deveria cumprir os quatro brevets até outubro, pois em novembro já muda o ano para a ACP. E ao tentar combinar as datas com sequência de eventos pelo país, vi que eu não tinha muita margem de modo que teria que fazer logo um BRM 200 para não perder as oportunidades dos BRMs 300 previstos para o final de maio, senão bye-bye para o SR em 2017.
Calendário de provas de 2017 disponível no site Randonneur Brasil

Então estabeleci que eu iria focar nas seguintes provas neste ano:

- BRM 200: 06 mai 17, em Itupeva/SP (organizado pelo Randonneurs Litoral)
- BRM 30020 mai 17, em Rio das Ostras/RJ (organizado pelo Audax Rio)
- BRM 40001 jul 17, no Rio de Janeiro/RJ (organizado pelo Audax Rio)
- BRM 60025 ago 17, em Florianópolis/SC (organizado pelo Audax Floripa)

Segunda etapa: o treinamento

Como as duas primeiras provas do Audax (a de 200 e a de 300) seriam obrigatórias e sem margem para falhas, os treinos teriam que começar imediatamente. Planejei correr apenas uma ou duas vezes por semana e pedalar 3 ou 4, com giros de 20 a 30 km de segunda a sexta-feira e pedais mais longos aos sábados e domingos. Também incluí alguns exercícios de fortalecimento pliométricos para core e membros inferiores, os quais faria 2 vezes por semana. Porém, como eu estava afastado das bikes a muito tempo eu ainda teria um grande problema a vencer que era me reacostumar com o selim!

Segui o plano, inicialmente dando uma folga de pelo menos um dia entre um pedal e outro. Nos primeiros treinos a região do períneo ficou dolorida mas depois de 10 dias eu já não sentia mais nada. Com 22 dias do meu retorno eu encarei 100 km com a speed e não tive qualquer desconforto nos fundos (link do pedal no Strava). Nesse pedal aliás, eu tirei um importante ensinamento sobre ser auto-suficiente com sais e eletrólitos. Desde as cãibras do Desafio 100 km em Floripa (clique aqui para o relato), eu tinha aprendido que tinha que tomar isotônicos quase que na mesma proporção da água. O problema é que diferente de todos os outros pedais mais duradouros que eu tinha feito até então, nesse último treino eu não encontrei nenhum lugar aberto que vendesse o produto na beira da estrada. Como resultado, nos últimos 15 km e com forte vento contra, as pernas começaram a travar e tive que diminuir bastante a velocidade. Cheguei em casa com bastante dor, que só foi resolvida após Gatorade e lanches salgados.

Continuei de acordo com o previsto, fazendo meu último giro 4 dias antes da estréia no brevet de Itupeva/SP. Nesse treino eu percorri uma distância de 36 km no ritmo mais forte que consegui, derrubando todos os meus recordes pessoais (RPs) do trajeto, terminando com uma média de 27,5 km/h, velocidade impensável até então para mim, levando em consideração a elevação acumulada de 439 m, proporção bem parecida com a do BRM 200 de Itupeva que eu iria enfrentar.

Terceira etapa: preparação da bicicleta e dos equipamentos

Abaixo eu irei relacionar todos os itens que eu pretendo levar para as provas do Audax, elencando entre parêntesis, de forma sucinta, a justificativa de cada objeto.

As organizações do Audax fazem 4 exigências básicas e obrigatórias no tocante a equipamentos. São eles:

- 2 luzes traseiras na cor vermelha (sinalização aos demais veículos);
- 2 faróis dianteiros (iluminar o caminho à frente);
- colete refletivo (ficar visível quando iluminado pelos faróis dos demais veículos); e
- manta aluminizada, a partir do BRM 300 (abrigo ou tratamento de hipotermia).

Além dos itens obrigatórios, entendo que deve também integrar o check list de qualquer um que deseje ter sucesso em provas ciclísticas longas:

- capacete (proteção);
- luvas (conforto e proteção);
- sapatilha de ciclismo (eficiência e segurança na pedalada);
- bermuda de ciclismo ou bretelle (conforto);
- blusa de ciclismo com bolsos traseiros (conforto e para carregar objetos);
- óculos de proteção com lentes para o dia e para a noite (proteção);
- blusa corta-vento (conforto e prevenção contra hipotermia);
- caramanhola (hidratação);
- câmaras reservas (substituição de alguma em caso de furo);
- kit remendo (consertar câmaras furadas caso as reservas acabem);
- espátulas (desmontagem do pneu e troca de câmara);
- bomba para encher pneu (encher a câmara);
- baterias sobressalentes (reserva para o sistema de iluminação);
- ciclocomputador (medir as distâncias e fazer navegação);
- celular (emergências e registro da pedalada);
- protetor solar (proteção);
- dinheiro trocado (alimentação, panes, transporte, etc);
- documentos pessoais (identificação, sobretudo em caso de acidente);
- bolsa de selim (carregar os acessórios).

Pessoalmente eu ainda adicionei os seguintes itens à minha relação:

- GPS (equipamento próprio para navegação);
- Power Bank (carregar o celular e o farol);
- cabos USB (conexão do celular e do GPS);
- sinalizador traseiro extra (maximizar a minha visualização aos demais veículos);
- sinalizador dianteiro piscante (maximizar a minha visualização aos demais veículos);
- adaptador de válvula presta para schrader (calibrar pneu em posto de gasolina);
- extensor para a bomba de pneu (encher o pneu mais rápido com a bomba manual);
- canivete multifunção (eventuais consertos na bike);
- chave de corrente (emendar corrente quebrada);
- fita isolante (coringa para diversas funções não previstas);
- bolsa de guidão (guardar o restante dos objetos);
- pneu reserva (em caso de rasgo de algum principal);
- caramanhola extra (água ou isotônico);
- meia de compressão (melhora a circulação e protege do frio)
- géis de carboidrato com e sem cafeína (reposição energética);
- barras de proteína (reposição de proteína para não catabolizar);
- isotônico efervescente ou em sachê (quando não encontrar isotônico nas paradas);
- mix de frutas desidratadas (complemento de alimentação);
- cartão do plano de saúde (necessidades médicas);
- cartão de crédito (pagamentos diversos e mais custosos);
- mapa da rota impresso (redundância para o caso do GPS falhar);
- planilha da rota impressa (redundância para o caso do GPS falhar);
- porta celular à prova d´água para celular (proteção contra chuva);
- saco estanque para demais itens que não podem molhar (proteção contra chuva).

Itens em análise:
- creme chamois ou vaselina (prevenção contra assaduras);
- bandana (proteção contra o sol);
- analgésico (no caso de dores musculares).

Depois de separar esses itens, foi necessário arrumar uma forma de colocar tudo na bicicleta e na minha roupa. Pode parecer muito, e realmente é mesmo, mas cabe tudo de forma bem harmoniosa e nem ocupa muito espaço. Tem gente que fica preocupado demais com o peso extra, mas para mim, que atualmente estou com 98 kg, isso não representa algo significativo Meu conforto é a minha segurança e vice-versa. Enfim, depois de acomodado foi necessário testar tudo nas mesmas condições da prova, ou seja, em pedais longos, de dia e de noite, no sol e na chuva. Foi necessário aprender a mexer no GPS (principalmente configurar e gerenciar a rota, colocar os pontos dos PCs e paradas planejadas, além de demais parâmetros); trocar o pneu de forma eficiente (rápida e correta, observando o posicionamento da fita anti-furo e verificando se não ficaram resquícios de sujeira e/ou arames dentro), saber fazer um remendo na câmara, saber sacar um elo da corrente, verificar quando e em quais condições usar a blusa corta-vento (no caso da minha, funciona também como capa de chuva). 

Obviamente nos testes que eu fazia foi normal de acontecerem problemas, afinal os erros são parte do aprendizado e eu teria margem para errar à vontade nos treinamentos, já na prova isso poderia ser crítico. Algo, por exemplo, que me fez testar inúmeras configurações foi o sistema de iluminação, já que dos dois faróis que eu tenho, um é extremamente forte, mas não tem bateria, sendo alimentado diretamente via USB e, portanto, o esquema em caso de chuva teve que ser bem pensado e provado (utilizei saco zip-lock). O outro farol é mais fraco, porém usa 2 baterias CR-2032 bem pequenas e que posso levar 2 ou 3 conjuntos sobressalentes. Fiquei então experimentando os posicionamentos no guidão e as situações em que usaria um ou outro, até que cheguei à solução ideal com a lanterna mais forte bem ao lado da mesa e a mais fraca no meu capacete. Outra prova foi com o Power Bank pois ele deveria suportar uma quantidade de tempo mínima para uso do farol. Com isso fiz experiências nos 3 modelos que eu tenho em casa. Contatei que apenas um deles suportava ao menos 7 horas na potência mais forte e os demais não aguentaram nem 30 minutos cada. Coisas da China! Já as luzes traseiras principais eu fiz experimentos em várias posições até decidir que o melhor seria nos seat stay, um de cada lado, sobretudo porque eu ainda terei uma luz sobressalente debaixo do selim e outra no capacete.

Outro cuidado que eu tive foi providenciar uma limpeza e checagem geral na bicicleta. Nesse ponto, resolvi eu mesmo fazer até para pegar mais intimidade com a mecânica da speed. Aproveitei para trocar os antigos pneus que vieram com ela, substituindo pelos Vittoria Zaffiro Pro 700x25c, que são um pouco mais largos e com kevlar no interior para ficar mais resistente aos rasgos e furos. Na sequência, vistoriei as fitas dos aros, a fixação de cada um deles nas rodas, a blocagem, os freios e os conduítes. Lavei com desengraxante toda a transmissão, o que inclui a corrente e os câmbios dianteiro e traseiro; depois lubrifiquei com óleo apropriado, removendo o excesso com um pano seco.
Bike preparada com todos os equipamentos para o BRM 200

Importante dizer que essa etapa de preparação dos equipamentos começou intensivamente uns 20 dias antes do brevet. Na verdade, até hoje, faltando dois dias para o BRM 200, cada vez que eu vejo a bicicleta eu penso na prova e checo alguma coisa, problematizo hipóteses. Acho que isso deverá fazer parte de todos os eventos que eu fizer no Audax, tendo sempre a segurança em primeiro lugar.

Quarta e última etapa: definição da estratégia para a prova

Máquina checada e pronta, faltava ainda a estratégia para a prova. No site da organização, o Clube Randonneurs Litoral, desde cerca de 2 meses antes eles já disponibilizavam o roteiro previsto. Lá tem um link para outro site especializado em rotas ciclísticas, onde é possível visualizar o trajeto de forma parecida com o Google Maps, alternando entre mapa e satélite, colocando ou tirando zoom, além de contar com o gráfico da altimetria do início ao fim. Pelo site é possível baixar o arquivo GPX com todos esses dados, o que foi importante para exportar para o meu GPS. Os organizadores também disponibilizaram a planilha do percurso, que nada mais é do que uma planificação da rota com as instruções de mudança de direção, nome das vias, distâncias acumuladas e ponto a ponto, e dos locais dos Postos de Controle (PCs).
Site com a rota da prova. Clique na imagem para visualizar.

Com todas as informações em mãos, passei a estudar detalhadamente o mapa para já ir memorizando os nomes dos principais pontos. Isso é importante porque tudo acontecerá em rodovias e cidades novas para mim e eu teria que estar familiarizado com a sinalização vertical que indica as direções para os diferentes lugares. Após, memorizei os locais de parada obrigatórios, que são os PCs, e mais alguns outros estratégicos para se eu estiver precisando descansar, me alimentar ou reidratar. Esses locais foram definidos com base na localização geográfica, aproximadamente no ponto médio entre um PC e outro. Com eles estabelecidos e plotados no meu GPS, eles funcionariam como parâmetro de referência para saber se eu estaria dentro dos limites previstos. 

Por fim, para efeito de estimativa do tempo de prova, com base no ganho de elevação do percurso e no meu desempenho nos meus últimos treinos, eu fiz uma previsão de término em 11 horas, caso não tenha problemas mecânicos ou furos de pneu. Isso daria uma média global em torno de 19 a 20 km/h, contando as paradas. Eu inclusive cheguei a pensar em dividir a jornada em 4 segmentos e definir uma média específica para cada um deles, mas para os 200 km eu ainda não acho necessário, mesmo porque a rota é muito parecida em toda a sua extensão, com muito sobe e desce constante, havendo apenas 3 subidas mais longas e que serão tratadas com leveza e delicadeza no momento que chegarem.

Tudo pronto, é hora de descansar. Os 4 dias antes do brevet são dedicados ao repouso para recuperação e acúmulo de energia com uma dieta diferenciada em carboidratos. Também pretendo disciplinar o meu sono para habituar o corpo com o horário mais cedo, principalmente nos 2 dias antes da largada.

Portanto, tudo planejado, treinado, checado, manutenido e definido. Não restando mais o que fazer, só tenho que torcer para que o grande dia chegue e que eu tenha um dia proveitoso, sempre com a proteção e a bênção de Deus. 

"Ele o cobrirá com suas penas, e sob suas asas estará seguro, pois sua verdade será escudo e defesa’" Sl 91: 4

terça-feira, 2 de maio de 2017

Ciclo romaria: Campinas a Aparecida

Ciclo romaria de Campinas/SP até Aparecida/SP

Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida

Desde jovem eu via na TV as pessoas fazendo viagens a pé e de bicicleta até o Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida e ficava intrigado: como é que essas pessoas arrumam tanta força, resistência e determinação? Uma dessas romarias que me marcou foi a que o Renato Aragão fez. Na ocasião ele percorreu a rodovia Presidente Dutra, saindo de São Paulo/SP, fazendo o trajeto de pouco mais de 200 km a pé, cercado de fãs e peregrinos. Isso para mim sempre foi algo fantástico, inimaginável, verdadeira prova de superação e de fé.
Renato Aragão em romaria para Aparecida em outubro de 1999

Essa ideia ficou como uma semente na minha cabeça e eu sempre imaginava que algum dia eu iria fazer o trajeto da minha cidade até Aparecida, mas isso teria que ser quando eu estivesse num momento espiritual perfeito, além de preparo físico em dia. Foi então que as duas condições pareceram se conciliar no final de 2015, quando eu estava fazendo os meus planos para o ano seguinte. Sabia que aquela sonhada viagem deveria acontecer e que ela seria iminente, ou seja, logo!

Por força disso, passei a me dedicar mais aos pedais longos. Fui gradativamente aumentando as distâncias para 60, 80 e até 100 km, sempre utilizando a minha velha Caloi. Contudo, logo percebi que ela não tinha muita vocação para giros longos no asfalto. Apesar dos pneus slic de 1.5, ela era pesada, fazia barulhos loucos e tinha uma ergonomia esquisita. Assim, aliado ao fato de querer me aventurar nas provas do Audax e tentar fazer a série completa em 2016, o que significaria completar os 200, 300, 400 e 600 km dentro do mesmo ano-calendário para conseguir o título de Super Randoneur, resolvi tirar o escorpião do bolso e comprar uma bicicleta própria para estrada, conhecida como road bike ou speed.

Fiz um bike fit virtual e comecei a fuçar no OLX, já que uma bicicleta dessas nova de entrada estava com preços impeditivos para mim. Depois de muita busca achei o que eu precisava e então comprei a minha Scott Speedster S1, numa oferta excepcional.
Minha nova speed

Com a nova máquina, fiquei ainda mais motivado nos treinos. Os pedais ficaram mais frequentes e eu até levei ela comigo em outra das minhas viagens a trabalho para Florianópolis/SC. Fiz vários passeios pela ilha, às vezes sozinho e outras vezes acompanhado de amigos. Conheci cada canto daquela fabulosa cidade, quase sempre em giros de 3 a 5h. Para não dizer que era tudo mil maravilhas, logo aprendi que aquele pneuzinho fino cobrava um preço caro para me levar mais rápido: os malditos furos eram frequentes. Até descobrir sobre a valiosa combinação de pneu novo + fita anti-furo + câmara com selante, eu acabei ficando expert em trocas táticas de câmaras furadas! Encarei isso como uma iniciação no mundo das road bikes.

Nesse ínterim a Semana Santa se aproximava e com ela o desejo de fazer a sonhada viagem para Aparecida veio como nunca antes eu tinha sentido. Era algo que brotava da alma e que eu não tinha mais como postergar. Me reuni com a da minha esposa e decidimos a data: a minha romaria pessoal iria acontecer no dia 23 de março de 2016. Passei para a etapa de planejamento logístico, fruto do aprendizado no Desafio de 100 km do Audax (se você não leu o relato, clique aqui). 

Parâmetros da viagem

Primeiramente, a decisão mais sensível foi estabelecer se eu faria o trajeto direto ou se eu o dividiria em duas etapas, com pernoite em algum hotel no meio do caminho. Abrindo o jogo, eu tinha sérias dúvidas se conseguiria chegar se resolvesse ir direto e por isso, em princípio, eu queria segmentar o roteiro. Contudo, compromissos pessoais, a perspectiva de gastos maiores e a própria provação da viagem, porque não, me fizeram mudar de ideia e firmar convicção de que teria que ser tudo de uma vez só.

Decisão tomada, hora de decidir em "como ir". Por óbvio eu pegaria a minha nova Scott, adaptaria os acessórios para uma pedalada maior e assim eu chegaria até mais rápido. Mas não... Tinham dois problemas nisso tudo. Primeiro que a speed estaria em Florianópolis e trazê-la para Campinas seria bastante trabalhoso. Segundo, que por mais que eu tivesse treinado com ela nos últimos 30 dias, o seu banco aerodinâmico ainda me causava arrepios! Sim, meus "fundos" estavam traumatizados com a T-Type devido ao Desafio dos 100 km e o selim fininho da minha nova bicicleta ainda me causava muito desconforto quando eu ficava mais de 3h sobre ele. Olhei então para o confortável banco da Caloi, deliciosamente recheado de gel e firmei convicção: é com a velha mountain bike aro 26 de 21 marchas que eu vou cumprir a minha romaria!
A bike escolhida

Pronto! Com as duas decisões mais difíceis tomadas, o restante seria mais fácil. Calculei o tempo da mesma forma que o Audax e estimei que a minha média horária geral deveria ser de 15 km/h, nem mais nem menos. Com base nisso, programei o roteiro e os locais das paradas para alimentação e reposição de água, basicamente a cada 30 km ou 2h, sempre em postos de combustíveis com boa estrutura, o que não seria difícil na Dom Pedro I e na Dutra. Aliás, decidi ir integralmente pela Dutra, rodovia que eu conheço muito bem e onde eu me sentiria mais confortável e seguro, apesar do fluxo intenso de caminhões. Comprei géis de carboidrato para suplementação a cada 40 min e barras de proteína para ingestão a cada 2h. A reposição de sais e eletrolíticos seria nas paradas programadas com isotônicos e lanches salgados. 

Sobre os cuidados e preparativos com a bike, mandei a MTB para uma revisão completa. Coloquei fita anti-furo nos pneus e pedi ao mecânico que o óleo da transmissão fosse do tipo mais resistente a água, já que havia alguma pequena chance de chuva no caminho. Comprei também 3 câmaras reservas novas, pois não queria imprevistos nesse setor. Coloquei duas lanternas para iluminar bem o meu caminho e outras 2 luzes vermelhas na retaguarda para ser bem visto. Além disso, eu usaria também o colete refletivo em X que havia comprado para o Audax. 

A viagem

Saí de casa às 4h da manhã daquela quinta-feira santa de 2016. Lembro bem que o céu estava escuro mas na minha mente uma coisa era bem clara: se dependesse apenas das minhas próprias forças eu não iria conseguir chegar ao destino final. Por isso mesmo, naquele início do pedal eu rezei muito pedindo ajuda e proteção, afinal seria uma viagem difícil, onde apenas Ele estaria me acompanhando e me ajudando.

Iniciei então com tranquilidade e girando leve. Não queria qualquer desgaste do tipo que tive em Florianópolis nos 100 km. Assim, peguei a SP-340 Campinas-Mogi, num curto trecho até a SP-065 Dom Pedro I. O clima era ótimo, a sensação era de estar beirando os 16º C e sem vento. Debaixo da camisa Jersey coloquei uma dry-fit de manga longa, apenas para esquentar o necessário. O plano era que essa blusa servisse também para proteção contra os raios UV que deveriam me castigar dali algumas horas. 

Em pouco tempo o sol já estava nascendo. Era a minha segunda vez vendo isso acontecer montado numa bike. Que coisa linda de admirar! E naquele momento eu estava no alto de uma grande subida na divisa de Campinas com Joaquim Egídeo me sentindo ótimo. Aliás, tudo nessa viagem estava planejado para que eu me desgastasse o mínimo, até o ritmo. Nas subidas eu colocava a menor coroa e a maior relação da catraca para não forçar nada as pernas. Nas descidas eu aliviava o banco e não fazia questão alguma de colocar força nos pedais para ir mais rápido - era momento de relaxar.

E assim os quilômetros da Dom Pedro foram sendo vencidos um a um, subida a subida e descida a descida. Aliás, descobri que aquilo não era uma rodovia e sim um tobogã. Certeza que os projetistas ganharam a mais para fazer tanta subida e descida naquela pista! As planícies quase não existiam, mas foi graças a isso que hoje, depois dessa experiência, passei a não ter mais o antigo medo das subidas. Descobri que elas não são intransponíveis, pois elas passam. Quando eu ficava em dúvida, simplesmente não olhava mais para cima, focava no giro redondo, alternava o tipo de força nos pedais, pedalava em pé, trocava a pegada do guidão, fazia zique-zague no acostamento, enfim, tudo valia a pena e uma hora eu chegava no topo da cota. E o melhor de tudo é que após uma longa subida sempre vem uma descida.

Já sobre a alimentação eu cuidei de tomar rigorosamente os géis de carboidrato nas horas determinadas, bem como as barras de proteína para não correr o risco de catabolizar. Comia misto-quente ou pão de queijo em quase todas as lanchonetes e tomava Gatorade e afins. Isso tudo me garantiu as energias e nada de cãibras em todo o trajeto. Eu aproveitava as paradas para reaplicar protetor solar, principalmente na nuca e nas coxas, locais que ficaram um pouco vermelhos mesmo com o cuidado que eu tive. Imaginem se eu não tivesse feito isso... Aliás se teve um vilão durante o percurso na Dom Pedro, foi o sol escaldante. Me lembro que após 6 horas de viagem ele estava forte na minha cabeça, com um calor imagino que de uns 36ºC. Inclusive foi especialmente desgastante o trecho entre as represas de Atibainha e Igaratá, onde o posto previsto para minha parada estava fechado. Sequei a caramanhola e a sede apertou. O que me salvou foi uma espécie de venda que tinha numa casa rural em frente uma escolinha daquelas bem pequenas. Esse foi um dos milagres que eu acredito ter acontecido comigo durante a viagem, já que nada indicava que ali seria uma venda. Parei de curioso e lá eu comprei duas garrafas de 1,5L de água e dois picolés. Foi o suficiente até chegar no próximo restaurante.

Após 9h 30min de pedal e cerca de 140 km percorridos,eu chegava à BR-116, rodovia Presidente Dutra, com o seu intenso volume de veículos. Parei logo no Frango Assado de Jacareí, e fiz uma longa pausa para o almoço. Diferente das demais pausas táticas, onde levei de 15 a 20 minutos, ali eu planejei ficar pelo menos 1 hora e meia para descansar e comer tranquilamente. Decisão acertada pois o sol havia judiado demais, as pernas estavam bem fadigadas e eu precisava daquela energia que somente uma boa refeição daria. Comi bem e deitei no chão para descansar, prendendo devidamente a bicicleta com a corrente num gradil perto de mim. Lembro que fiquei mais de meia hora com os pés para cima pensando do restante do trajeto.
 
Reposição calórica no Frango Assado de Jacareí/SP

Pausa para descanso na hora do almoço

Perto da hora de partir, ouvi um um trovão. Sim, de uma hora para outra o tempo havia mudado e o céu azul deu lugar ao cinza escuro. Começou a chuviscar e resolvi partir logo na esperança de sair debaixo das nuvens carregadas. Porém aquela simples garoa se transformou numa forte tempestade e em menos de 20 minutos os pingos já caiam grossos e bem doloridos. Quando eu passava por São Jose dos Campos, optei por ficar nas vias laterais para evitar os caminhões, mas em alguns trechos a água era tanta que batia na metade das minhas rodas. "Não tem problema", pensei, "chuva é bênção dos céus"! De fato, mesmo molhado eu me sentia melhor assim do que castigado pelo sol. 

Por sinal, o trecho de São José dos Campos foi decididamente o pior para mim, mas não porque da chuva e sim porque do volume de automóveis. Mesmo parecendo uma árvore de Natal iluminada, eu estava com medo dos veículos grandes que passavam muito perto de mim em altas velocidades. Como conduta preventiva eu trafegava pelo acostamento sempre beirando o seu limite direito, perto do mato ou das vielas, mas mesmo assim os sprays de água dos pneus me atingiam com violência constantemente. Sem falar que algumas pontes não tinham acostamento e nem calçada. Nessas eu desembarcava da bike e atravessava empurrando com o maior cuidado, muitas vezes me abrigando no alto das muretas de cimento. Em alguns aclives com 3ª faixa e sem acostamento, lembro que eu ia pelas valetas de águas pluviais, contra a correnteza mesmo. Estava mais seguro ali do que no bordo da pista.

Aproveitei que pelo menos a temperatura era mais amena e acelerei um pouco, pelo menos quando dava. Queria chegar logo em Eugênio de Melo para estar mais livre do grosso do movimento de caminhões e pedalar mais tranquilamente. Mas esse "acelerar" foi relativo porque na verdade a minha média horária estava piorando bastante. A diferença da velocidade com chuva era nítida e eu fazia o que podia para não extrapolar as minhas condições. A essa altura eu já tinha certeza de que iria chegar, só não sabia a que horas isso seria. E honestamente, saber quando eu iria entrar em Aparecida não era mais tão importante assim. Eu queria mesmo é concluir o pedal, mesmo que o tempo extrapolasse ao planejado. 

Continuei firme, bem como a chuva. Passei por Caçapava já de noite. Continuava parando a cada 2 horas aproximadamente. Descansava 20 a 30 minutos e seguia. Lembro muito bem que a minha última pausa foi em Pindamonhangaba, a cerca de 30 km de Aparecida. Ali os minutos parados para reabastecimento foram bem difíceis pois esfriou muito o meu corpo. Eu não tinha nada para me aquecer além da roupa que eu estava desde que saí de casa, sendo que eu não levei corta-vento ou capa de chuva. Quando saí do posto e voltei a tomar a chuva no peito e nas costas eu tremia tanto quanto uma velha Toyota Rural. Meu queixo batia involuntariamente, de verdade, e fiquei desesperado com o frio. Mais uma vez eu rezei pedindo ajuda... E enquanto eu rezava acelerei o ritmo até o quanto eu consegui. Parecia que era Papai do Céu me dizendo que essa era a última pernada e que eu não precisava mais me poupar. Deu certo o logo o meu corpo já estava aquecido. Mais uma hora e meia e eu cheguei em Aparecida. Essa última etapa foi bem rápida mesmo e não senti qualquer fadiga. Eu tinha 3 géis de carboidrato com cafeína que deixei para o final e creio que isso foi determinante para o gás extra. 

Enfim, pouco mais de 17 horas depois da minha partida de Campinas eu chegava no hotel San Diego Express em Aparecida. A minha esposa estava me esperando pois havia ido de ônibus para me encontrar. Ela me completa e é a minha segurança. Nós dois já enfrentamos muita coisa juntos e essa era apenas mais um dos nossos desafios, por isso mesmo ele teria que ser finalizado junto dela, que me recepcionou com lágrimas nos olhos. Eu imediatamente me ajoelhei, totalmente emocionado, e passei a agradecer ao Pai e à minha Mãe Maria pelas bênçãos que eu recebera todos os dias da minha vida. Nessa hora passa um filme pela nossa cabeça com os vários episódios de dificuldades e superação. Aquele momento na porta do quarto do hotel ficará para sempre guardado na minha mente, juntamente com a imagem da Basílica de Aparecida ao fundo.
Chegada ao hotel em Aparecida, com a Basílica ao fundo

Números

Tempo total: 17:24:29
Média horária total: 13,87 km/h
Tempo em movimento: 13:34:27
Média da velocidade (líquida): 17,80 km/h
Distância total: 241,5 km
Elevação acumulada: 4.301 m
Tempo em subidas: 06:01:02 (42% do tempo)
Calorias gastas: 12.294
Pneus furados: 0 (zero)

Link do Strava com o registro e o roteiro da viagem: https://www.strava.com/activities/525101903

Mapa do percurso. Clique para detalhes.

Conclusões
  • A escolha da bicicleta foi acertada à medida que a viagem teve mais a ver com a minha espiritualidade do que com desempenho.
  • A fita anti-furo é fundamental, especialmente em rodovias. Elas pareciam cactos do deserto quando desmontei as duas rodas. Tinha muito arame de pneu encravado nelas.
  • Um pedal desses não emagrece.Todas as calorias consumidas são repostas imediatamente nas paradas pois eu tinha uma fome absurda em todos os restaurantes e não queria correr o risco de ficar sem energia.
  • Planejar é preciso! O tempo gasto com os preparativos e estimativas é, na verdade, um investimento e aumenta demais as garantias de sucesso. Mas em 20 minutos tudo pode mudar!
  • Além da fé tornar possível superar montanhas, ela faz você chegar aonde jamais esteve.
EBENÉZER: "Até aqui nos ajudou o Senhor!" (Samuel 7:12)